“O símbolo da liberdade é o c*, que todo mundo tem.” [TATUAGEM]

 Em 1969, a comunidade lgbt sofria ataques violentos da polícia de Nova York em forma de invasão aos bares que frequentavam, e violências cometidas por parte das “autoridades”; o ataque mais marcante, foi o que aconteceu nas primeiras horas da manhã de 28 de junho no bar Stonewall Inn quando pessoas que estavam no local reagiram ao atentado, uma delas Marsha P. Johnson, mulher negra trans, jogou um tijolo em um policial – estava ali posta a revolta contra o estado.

Claro que não começou em 69 – nem a violência nem a diversidade sexual, visto que durante as décadas de 50 e 60 poucos estabelecimentos norte-americanos recebiam qualquer indivíduo que se identificasse como gay, lésbica ou travesti, (visto também toda história da propriedade privada); mas foi a partir desse ano que organizaram-se protestos em favor do direito dos homossexuais em várias cidades como resposta ao que sofriam. Em 1970, um ano depois da Rebelião de Stonewall, aconteceu a Primeira Parada do Orgulho Gay da história – o orgulho surge da revolta. 

No Brasil, em 1964, instalou-se a Ditadura Militar e através de seus aparatos, a comunidade lgbt era presa, torturada e morta com a justificativa de que estavam “cometendo viadagens”, e isso era crime. Só em 1995, no Rio de Janeiro, tivemos a primeira Parada do Orgulho Gay no país. Por quê tantos anos depois? Porque o período da Ditadura perdurou até 15 de março de 1985. São 21 anos de censura, prisões, mortes e torturas.

São tantos nomes de luta que podem ser citados pelo mundo todo. A luta pelo orgulho lgbtqi+ é ampla e intrínseca à nossa existência – viver é a própria afronta. Criar arte livre é chamar a guerra. São também vários filmes e documentários que relatam essas situações de opressão e (r)existência; poemas, performances, apresentações de dança, composições musicais e teatro. Mesmo onde não chega a possibilidade de produção áudio-visual, a arte vibra, em suas velocidades diversas.

Introduzido tudo isso, trago a importância do longa “Tatuagem”, filme de 2013 do diretor Hilton Lacerda, que narra um romance entre Clécio (Irandhir Santos), diretor da trupe teatral “Chão de Estrelas”, e Fininho (Jesuíta Barbosa), soldado militar. O filme se passa em 1978, Recife, onde o conflito desse relacionamento se instala fortemente na interface política que sua convivência se propõe. Apesar de apresentar de uma relação homoafetiva e isso ser tratado de forma bem bonita e delicada, o que mais destaca na história é a resistência. É o ORGULHO lgbtqia+, é a unanimidade da potência artística, a liberdade de expressão, o cantar, o recitar, o dançar, o criar! 

“Tatuagem” se propõe a ser altivo não só à comunidade gay/lésbica/trans, mas também à comunidade artística. Trata da repressão e à censura, ilustra as invasões que esses espaços sofriam e, paralelamente, a força do artista de se reerguer renovado. A relação entre Clécio e Fininho toma segundo plano quando podemos analisar a retratação do que é uma trupe teatral e suas relações socio-políticas bem como seu objetivo moral: a liberdade. “A práxis do improvável junto à epifania da desordem.” 

No mais, para além de recomendar o filme enquanto recorte da história de resistência da arte nordestina em plena Ditadura, recomendo pela composição impecável de fotografia, trilha sonora, direção de arte, elenco e atuação, roteiro e sensibilidade. São filmes como esse que me lembram que lutas, como essa, só são possíveis porque somos nós e somos muitos. Mesmo que, materialmente, judicialmente, politicamente, socialmente nada ajude, ainda assim é possível. Mais uma vez, o orgulho surge da revolta. E por isso, viva a arte, que sendo justa à si mesma, não exclui, não limita, é caótica, necessária e acolhedora daqueles que precisam ser ouvidos – o palco é o nosso megafone, falemo-nos.

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