"O nosso deserto é de ouro" [REZA A LENDA]

 E quem disse que cinema brasileiro é parado e chato? E quem disse que não tem ação e bang-bang? Reza a lenda é um resultado espetacular!

Ação/drama, roteiro preciso, sem muitas delongas, pontual, tópico. As interpretações estão a todo vapor e a trilha sonora é precisa, moderna, numa envoltura do público e personagens – todos eles – orgânica, fazendo a gente sentir o coração acelerar em cada ironia árida que agarra na garganta.

“Deus queria parar de se olhar e criou o mundo. O homem queria parar de se olhar e criou Deus.”

O trailer não faz jus ao filme; não pela qualidade, mas pelo movimento e tempo da história. Como disse um amigo meu, “a gente vê o trailer e imagina um Mad Max brasileiro, mas não é.” Não mesmo, o tempo é tão esquálido quanto o cenário. O que não desqualifica em nada a trajetória.

O longa pop sertanejo se passa no sertão nordestino, numa contação mística e envolta de fé em que Ara (Cauã Reymond), líder de um bando de motoqueiros de histórias traumatizadas, crentes de uma lenda que envolve uma estátua santificada, capaz de fazer chover. A estátua, no entanto, estaria em posse de coronel Tenório (Humberto Martins) até que é roubada e o coronel concentra todas as forças para perseguir o grupo que em fuga, encontra Laura (Luisa Arraes) num acidente, e a levam, contra vontade de Severina (Sophie Charlotte), apaixonada por Ara (e quem não?). Numa das cenas, Severina questiona Ara “quando eu te conheci mais Pai Nosso, jurei que te seguiria até o inferno”, no que Ara responde “e estamos onde?” – isso pode traduzir um tanto da relação em que se encontram.

Contando assim, parece mais do mesmo, mas não é!  É uma super produção de efeitos especiais, fuga, ritual, cultura brasileira, fé, romance cru, intriga, ciúme, feridas, conquistas e “seguir em frente” – é um filme bastante completo, somado a uma junção feliz da escolha do elenco.

E mais: apesar de ser um filme bruto, é um filme muito afetivo, representativo de como alguns laços se laceiam, porque mesmo sendo uma formação de gangue muito sincera e fortalecida entre si, apesar das tantas crises que permeiam, é uma relação que se dá pela necessidade, pelos encontros nos desencontros…

“Tenho uma relação afetiva com o ambiente do cangaço porque minha família era do interior do Sergipe. Lembro do meu avô me contando algumas histórias. Por mais que fosse algo muito violento, meu avô transformava isso em fábulas”: Olivetto, diretor do filme, numa entrevista.
Pessoalmente, saúdo a interpretação de Jesuíta Barbosa (mais uma vez ele rs) como parceiro fiel de Ara, o Pica-pau, assim como saúdo também todo o desenvolver do personagem que toma espaço no decorrer das cenas.

Enfim, eu recomendo que assistam; inclusive estou agora encerrando o texto para assistir, mais uma vez, essa produção que merece uma segunda e mais olhadas – o nosso sertão é rico, a nossa cultura é extensa, as nossas crendices são múltiplas, o nosso cinema é lindo!

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